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06/12/2017 / Publicado em Artigos Autorais

Ao ocaso da Baleia azul

Quando morre um indivíduo, podemos buscar o fato que responde pela precedência do que tão específica e fundamentalmente morreu – leia-se, sim, antes. Quando alguém está, por exemplo, acometido de uma enfermidade no seu corpo, é por esse mesmo mal especificamente que o sujeito pode vir a morrer, de modo que se trata de algo referente a um ou mais órgãos. O que rasga o véu da existência, assim, é algo que recai sobre uma parte do corpo. Tal órgão, por ser parte propriamente de um conjunto, de uma engrenagem que funciona no todo respeitando o funcionamento de cada uma de suas partes pode, dessa maneira, vir a pôr em risco a sobrevivência dos outros órgãos – aos quais está imediatamente submetido/ligado –, dos sistemas e, no limite, a subsistência do corpo em si, desembocando na questão da sobrevivência do próprio sujeito. Mostra-se claro, em suma, que algo da parte morre antes da morte do todo.

Ao tomarmos o funcionamento do organismo humano como exemplo, aquilo que está para além do corpo não está para aquém dessa lógica, mas alcança o universo das disposições gerais da vida do sujeito, e é sobre isso que iremos nos ocupar a seguir.

Ações em torno da problemática do suicídio têm ganhado espaço, sobretudo nos últimos dias, a partir do “jogo” denominado “Baleia azul”, o qual tem conquistado relevante popularidade, especialmente entre os mais jovens, em diversos lugares do mundo. Constituído pelo que se tem chamado de “desafios”, tal artifício consiste em reunir pessoas em determinado espaço virtual, com o propósito de lhes apresentar “tarefas” a serem realizadas – diga-se, fora do espaço virtual. No entanto, ocorre que suas mais emblemáticas peculiaridades se fazem pela presença dos elementos agressividade/violência, no que diz respeito aos participantes para consigo mesmos, uma vez provocados pelo responsável pela condução do jogo macabro.

Tais desafios se referem a cortes pelo corpo, definindo muitas vezes, nesse ato de automutilação, a imagem de uma baleia (relativamente ao nome do jogo), saltar de lugares altos, entre outras coisas semelhantes, podendo vir a chegar ao último desafio, que consiste em o sujeito dar fim à sua própria vida. Alega-se que, ao contrariar os organizadores de tais desafios, por eventualmente não se mostrarem dispostos a cumprir tal “fase”, os participantes passariam a ser perseguidos, e seus familiares alvos de ameaças de morte. Tal fase, a pior e última, por um lado, escancara o caráter sinistro do esquema e, por outro lado, desperta curiosidade sobre as pessoas que, advertidas ou não do que encontrarão pela frente, podem cair nessa armadilha, revestida de alto grau de periculosidade, mas vestida, em alguma medida, de entretenimento.

O suicídio representa, do ponto de vista da formação do sintoma, o ápice absoluto de seu fechamento. Enquanto a fala desata o nó do sintoma, o suicídio se apresenta como expressão máxima de uma palavra para a qual não houve uma possibilidade especial, que não veio efetivamente a ganhar emergência – o que vem a contribuir, nesses casos, para o naufrágio do sujeito no mar da pulsão de morte. A rigor, com a palavra se pode articular uma questão, nomear determinada coisa, transmitir uma ideia/concepção, construir um sentido, elaborar uma experiência, identificar seus pontos de gozo, compartilhar com um interlocutor sobre seus modos de existência pessoais, de modo que é de uma abertura de que se trata, de algo que é essencialmente plástico, que faz sentidos, energias, ideias e afetos poderem circular e oxigenar a libido, avivar o desejo e, em suma, despertar para a vida.

Algo que sobremaneira se evidencia no contexto que precede o ato suicida é, muito especialmente, a busca decidida pela cessação das consequências de algo em relação ao qual o sujeito não está conseguindo elaborar de forma satisfatória – em última análise, algo para o qual o sujeito, radicalmente, não teria encontrado outra saída. O suicídio é precedido por uma relação com algo de insuportável – no sentido estrito do termo – para o sujeito. Trata-se, todavia, menos de uma afirmação da morte em si mesma, e mais de uma negação radical da forma como o sujeito tem se apresentado à vida (e esta, a este), o que se segue de um veemente sentimento de impotência face às exigências do sofrimento, da bem estabelecida convicção dos termos de sua desesperança, e, portanto, da projeção da irreversibilidade do estado de coisas que lhe concerne intimamente.

Uma questão que se coloca muito particularmente, diz respeito ao lugar que as famílias vêm ocupando no tecido da civilização. De antemão, algumas indagações se impõem – quais sejam: o que faria uma criança ou um adolescente não buscar os seus pais a fim de lhes comunicar sobre o modo específico do funcionamento do jogo em questão, seus riscos e idiossincrasias? O que estaria a provocar tal distanciamento entre filhos e pais, de maneira que ambos não estariam a desfrutar de uma relação de cuidado e confiança mínimos, para que lhes fossem asseguradas importantes medidas de segurança e proteção? O que estaria contribuindo para essa falha, que não é fundamentalmente relativa à comunicação, mas à posição que cada um ocupa no arranjo familiar?

Cabe aos pais se questionarem, de forma radical, sobre como estão a se implicar com a vida dos seus filhos. Não se faz, para isso, de modo algum, uma demanda de sapiência para que seja possível manejar determinadas situações/casos junto aos filhos, mas antes e, efetivamente, de um cuidado ativo, expresso pelo acolhimento, diálogos, os quais se enriquecem quando precedidos por uma definição consistente de presença real e verdadeira, se desdobrando em disponibilidade decidida, da qual os filhos podem desfrutar, e na qual podem confiar. Elementos como responsabilidade, sensibilidade e cuidado, uma vez presentes, assinalam o amor e a maturidade parentais, de modo que, mais adiante, ao se confirmar eventualmente a necessidade de que seja dado início a um tratamento profissional, um psicólogo ou um psicanalista, especialmente, poderão intervir – uma vez que a criança, ou o adolescente lhes sejam encaminhados –, a partir de conhecimentos e técnicas apropriados a cada caso.

No que diz respeito especificamente a esses casos dos quais estamos nos ocupando aqui – quanto propriamente aos jovens que têm se envolvido, ou aqueles que se envolveram e vieram a ter suas vidas ceifadas –, algo da família do indivíduo pode ter morrido, antes. A família é uma instituição que constitui parte importante da sociedade, e dela se espera minimamente o estabelecimento de um centro privilegiado de referência para as crianças e adolescentes. Em episódios como esses da Baleia azul, denuncia-se a fragilidade dos laços humanos nos nossos dias, o grau de pobreza de experiências afetivo-amorosas e a falta do reconhecimento de cada um, como pessoa singular, e que deve ser respeitado, assim como o rareamento de encontros vivos, plenos, de modo que, os diálogos, especialmente, podem fazer toda a diferença necessária, face aos desfechos que têm marcado a participação de tais jovens nessa vereda nefasta e noutras experiências correlatas.

Como psicólogo, haja visto a incidência da depressão na sociedade de nossos dias, costumo ouvir com certa frequência perguntas sobre as causas desse mal contemporâneo. É sabido que, em grande medida, aponta-se para determinados fatores como lares desfeitos, isolamento social, desilusão amorosa, esgotamento no trabalho, o recuo perante o desejo, enfim. Irei destacar aqui outro fator causal: a banalização da dor. Familiares, amigos e professores, especialmente, incorrem em erro crasso, realmente grave, ao conduzirem com negligência uma experiência de dor psíquica de um determinado indivíduo. Tal irresponsabilidade pode sair muito cara para aquele indivíduo, para a sociedade como um todo e, igualmente, portanto, para as próprias figuras referidas acima. A pessoa que sofre deve ser acolhida, para que lhe possa ser dado o devido destino: tratamento especializado. A banalização da dor e do sofrimento psíquicos desconsidera a seriedade do problema vivido, a história de vida do sujeito e, logo, as consequências que tal indiferença pode implicar.

O espaço de uma oferta de identificação em série com um conjunto de outras indivíduos que, supostamente, estão atravessando algum sofrimento, possivelmente acometidas de um transtorno como a depressão, pânico ou, fora dos quadros nosográficos regulares, como pode ocorrer no caso de um extremo grau de solidão, a própria dimensão da falta de sentido para a própria vida pode, enfim, constituir um canal de comunicação com potencial de atração para compartilhamento de informações, relatos de experiências de ambas as partes, numa espiral de absorção de determinados conteúdos associados ao pior, e que, no limite, pode levar os indivíduos a perder por completo a noção de realidade, haja visto que tais incitações ao terror se dão, à distância dos responsáveis, em sua forma on-line – nesse caso, na linha da morte.

Há ofertas de escuta, amparo e cuidado disponíveis no mundo para aqueles que estão a sofrer; uma pessoa não precisa pôr fim à própria vida em função de não ter sido possível encontrar, em si mesma, os recursos de que ela precisaria para sair do seu atual estado de sofrimento. O outro é aquilo que está para além do limite do eu; somos parte de uma mesma espécie, e o que não encontramos em nós mesmos, a priori, podemos, numa relação com outra pessoa, vir a conhecer, aberto à surpresa, disposto a se apropriar disso, abrindo um processo de renovação de si mesmo, mediante as demandas e o estilo de cada um, e assim avançar.

A clínica psicanalítica nos familiariza com a experiência de que a salvação passa pela palavra, pela fala e pela escuta (de si, antes de mais nada), podendo o sujeito vir a compartilhar sobre sua condição com um outro. À falta da falta (angústia) se responde com a introdução da própria falta, experiência da ordem do desejo, definidor da incompletude do sujeito humano. O outro pode constituir uma possibilidade privilegiada de amparo e de cura. A fala convoca o sujeito à responsabilidade pelo seu gozo. Nas palavras do psicanalista Éric Laurent, “a psicanálise é uma maneira de refletir sobre a vida e sobre os impasses da existência, o objetivo é mudar o estado das coisas no interior de si mesmo. Assim é a psicanálise: a cura como aventura pessoal, e também um tratamento”. O convite à palavra, ao saber, move a psicanálise, que, reiteradamente, o faz aos sujeitos.

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Concebo a clínica como lugar de vivificação da existência humana. Aqueles que se dão à oportunidade para esse importante passo, motivados a partir da presença de um sinto-ma, cuja razão de ser pode não estar revelada a priori, podem vir a encontrar, no seio da experiência por nós proposta, novas razões de ser para si próprio e, portanto, para um fazer mais interessante e pleno com a própria vida.

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